top of page
Rui Marques

Flexibilidade, serviço ao cliente e mudança rápida de série

Atualizado: 16 de jul.




RESUMO

Neste artigo abordamos o tema da flexibilidade, entendida como a capacidade de fornecer pequenas quantidades de produtos variados em prazos curtos, e como a redução dos tempos de mudança de série de fabrico permite fazê-lo economicamente.

 

INTRODUÇÃO

Um dos pilares do Lean, oriundo do Sistema de Produção Toyota, é o Just-In-Time, que pode ser descrito resumidamente como a capacidade de produzir, no momento certo, a quantidade exacta, do produto conforme que o cliente deseja.

A realidade actual da generalidade dos mercados, numa tendência que se vem fazendo sentir há já bastante tempo, aponta para a necessidade de produzir uma grande variedade de produtos diferentes, em quantidades tendencialmente cada vez mais pequenas e com prazos de entrega cada vez mais curtos.

Dito de outro modo, é de particular importância, para a sobrevivência das empresas industriais, desenvolver a capacidade de produzir eficientemente lotes pequenos e variados.

Veremos de seguida como, ao longo do tempo, foram desenvolvidos e aplicados diferentes paradigmas de dimensionamento de lotes de produção.

 

O PARADIGMA DA PRODUÇÃO EM MASSA

O paradigma da produção em massa estabelece que, quanto maior a quantidade a produzir, menor será o custo unitário da produção (ver figura 1). Tal deve-se, de acordo com as regras do paradigma, à absorção dos custos de investimento, de setup, de arranque, de não qualidade, entre outros.

Podemos resumir este paradigma na frase “quanto maior o tamanho do lote de produção, melhor!”











Figura 1


Podemos entender a aceitação deste paradigma, dada a simplicidade do raciocínio (intuitivo) que o sustenta.

O paradigma da produção em massa continua enraizado em muitas organizações, nas quais o pensamento dominante continua a privilegiar a produção de grandes séries, mesmo quando as realidades do mercado apontam para a necessidade de fazer o contrário.

De facto, uma consequência, natural e inevitável, da adopção deste paradigma é o aumento dos níveis de stock, pois quanto maiores as quantidades produzidas, para as mesmas vendas, maior o stock resultante. Outra consequência, que decorre da anterior, é o aumento do lead-time (entendido como o tempo que decorre entre o início e o final do processo).

Neste paradigma, o serviço ao cliente é conseguido:

  • No caso de fabrico para encomenda, com prazos muito longos (consequência do lead-time)

  • No caso de fabrico para stock, com prazos curtos, mas com custos elevadíssimos de posse de existências (consequência do tamanho dos lotes).

Atendendo a estas realidades, o paradigma da produção em massa foi sendo questionado, tendo sido propostas outras alternativas.

 

O PARADIGMA DA QUANTIDADE ECONÓMICA DE ENCOMENDA

Desenvolvido por Ford W. Harris (Westinghouse) em 1913 e divulgado por R.H. Wilson, este modelo defende o cálculo de uma quantidade económica de encomenda (ou lote económico) que minimiza o custo total. Este custo total é o que resulta da soma do custo de posse (ou custo de stock) e do custo de encomenda (ou lançamento), conforme representado na figura 2.












Figura 2


R.H. Wilson propôs a seguinte fórmula para cálculo da referida “quantidade económica de encomenda”:









Sendo:

Q* = a quantidade económica de encomenda

D = a quantidade correspondente à procura anual

K = o custo fixo de encomenda ou de setup, independente da quantidade

h = o custo anual de stock, por unidade


Este modelo que, contrariamente ao paradigma da produção em massa tem a vantagem de considerar também o custo de posse de stock, apresenta, todavia, algumas limitações que tornam complicada a aplicação de uma fórmula aparentemente simples:

  • A dificuldade real em calcular a componente do custo correspondente ao lançamento em produção (refira-se que o modelo foi originalmente desenvolvido para compra de produtos a fornecedores externos, em que este cálculo é mais evidente);

  • A nem sempre consensual e fácil forma de calcular o custo de posse de stock, que é muitas vezes subestimado.

Talvez pelas dificuldades e limitações anteriormente referidas, é comum encontrarmos empresas que utilizam tamanhos de lotes (dimensionados usando a fórmula de Wilson) totalmente desatualizados e desfasados da realidade.

A dificuldade em (re)calcular periodicamente a quantidade económica (o tamanho de lote “ideal”) inibe a adaptação das empresas a ambientes concorrenciais dinâmicos, impactando negativamente a sua flexibilidade.

 

A FLEXIBILIDADE NO SISTEMA DE PRODUÇÃO TOYOTA

O Sistema de Produção Toyota propõe uma abordagem totalmente diferente das anteriormente descritas.

De acordo com o paradigma Toyota, ligado à génese e história da empresa, o stock é um desperdício a ser combatido incessantemente, pois mobiliza recursos preciosos e alonga o lead-time (ou time line, na descrição de Taiichi Ohno).

Assim, e contrariando o senso comum, os lotes de produção devem ser os mais curtos possíveis (desde que não afetem o tempo necessário para produzir os produtos correspondentes à procura).

A restrição à diminuição do tamanho do lote passa a ser unicamente a capacidade.











Figura 3


Na prática, calcula-se o tempo disponível para mudanças de produção subtraindo ao tempo de abertura o tempo necessário para produzir a procura do cliente (com a margem estritamente necessária para cobrir ineficiências). Dividindo o tempo disponível para mudanças pelo tempo médio de mudança, obtém-se o número de mudanças que se podem realizar no período de tempo considerado e, em consequência, o tamanho de lote de produção.


Sendo:

D = Procura no período considerado

Ta = Tempo de abertura

Tp = Tempo necessário para produzir a procura (ter em conta OEE)

Td = Tempo disponível para mudanças

Tm = Tempo médio de mudança

N = Número de mudanças

L = Lote a produzir

Obtém-se:

Td = Ta – Tp

N = Td / Tm

L = D / N


Este paradigma levou a Toyota e posteriormente outras empresas japonesas do sector automóvel a um esforço contínuo de redução dos tempos de mudança de série, aproveitada para melhorar a flexibilidade, contrariamente ao praticado durante anos pelas empresas ocidentais que utilizaram a redução dos tempos de mudança para ganhar capacidade e continuar a produzir grandes lotes.

 

A REDUÇÃO DO TEMPO DE MUDANÇA DE SÉRIE

Nos inícios dos anos 50 a Toyota adquiriu prensas equipadas com sistemas de mudança rápida de ferramentas e deu início, no seu departamento de estampagem, a um esforço de redução de tempos de mudança de série (traduzido para inglês como Quick Die Change QDC). O método desenvolvido baseava-se no ECRS – Eliminate, Combine, Rearrange, Simplify do Programa TWI Training Within Industry.

Nos anos 60 tinha sido possível reduzir para 15 minutos, em média, tempos de mudança que antes demoravam 3 a 4 horas. Nos anos 70 os tempos de mudança tinham sido reduzidos para 3 minutos.

Shigeo Shingo, consultor especialista em engenharia industrial, participou em 1969, na Toyota, num destes trabalhos de melhoria. A experiência que adquiriu foi depois por si formalizada num método cuja designação em inglês é Single Minute Exchange of Die (SMED), que se pode traduzir em “mudança de ferramenta em menos de 10 minutos (um só dígito)”. Este método foi divulgado por Shigeo Shingo num livro da sua autoria editado em 1981 com o título "A Revolution in Manufacturing: the SMED System ".

O método, tal como explicado por Shingo, compreende os seguintes passos:

  • Observação do método actual de mudança

  • Separação das actividades internas e externas (actividades internas são aquelas que só podem ser realizadas com a máquina parada; actividades externas são aquelas que podem ser realizadas com a máquina em funcionamento)

  • Conversão, onde possível, de actividades internas em externas

  • Racionalizar as actividades internas

  • Racionalizar as tarefas externas

  • Documentação e formalização do novo método

  • Repetição do ciclo de melhoria


O efeito da aplicação do SMED é resumidamente descrito no esquema seguinte:



O SMED, com origem na indústria automóvel, em prensas de estampagem de peças de carroçarias, foi sendo progressivamente aplicado a outras indústrias e, posteriormente a outras actividades como a saúde (blocos cirúrgicos), a hotelaria, e o desporto (Fórmula 1…), entre outras.

Pode ainda ser aplicado, com vantagem, em operações de manutenção preventiva.

Conforme referido anteriormente, o conceito SMED Single Minute Exchange of Die implica mudanças de série em menos de 10 minutos (um dígito). A evolução do conceito deu origem ao OTED One Touch Exchange of Die (mudança de série em menos de 60 ou 30 segundos, consoante as fontes) e ao Zero Changeover (mudança de série instantânea).

 

EM SÍNTESE

A aplicação competente e continuada do SMED leva à redução considerável dos tempos de mudança de série e, consequentemente, à diminuição drástica do tamanho dos lotes de fabrico e dos níveis de stock. Tal permite o aumento da flexibilidade da empresa, que ficará em condições de melhor servir os seus clientes, produzindo economicamente uma maior variedade de produtos, em pequenas quantidades e com prazos de entrega curtos.

 

REFERÊNCIAS

  • Shigeo Shingo

"A Revolution in Manufacturing: the SMED System "

CRC Press

ISBN-13: 978-0915299034

ISBN-10: 0915299038

 

  • Kenichi Sekine; Keisuke Arai

"Kaizen for Quick Changeover: Going Beyond SMED"

Productivity Press

ISBN-13: 978-1563273414

ISBN-10: 9781563273414

 

  • Michel Baudin

“Lean Logistics”

Productivity Press

ISBN 1-56327-296-2

Comentarios


Los comentarios se han desactivado.
bottom of page